segunda-feira, 22 de outubro de 2018

Aprendendo o que Deus revela

Nossa vida, quer dizer, nossas experiências (aquilo que necessitamos, queremos e sentimos) são importantes em nossa formação espiritual. Afinal, são exatamente o material que está sendo formado. No entanto, nossas experiências não podem ser usadas como diretrizes da própria formação. Entre outras coisas, espiritualidade significa levarmos nós mesmos a sério. Significa ir contra as tendências culturais nas quais somos incessantemente banalizados e levados à condição de escravos dos produtores e anunciantes, constantemente despersonalizados e rotulados de acordo com nossos diplomas e salários. Entretanto, somos muito mais do que nossa utilidade ou reputação, de onde viemos e a quem conhecemos; nós somos a imagem de Deus única, eterna e impossível de ser reproduzida. Uma vigorosa afirmação da dignidade pessoal é fundamental para a espiritualidade. 

Há um senso segundo o qual jamais devemos nos levar a sério demais. No entanto, somos assunto sério. Fomos formados de "modo assombrosamente maravilhoso" (Salmo 139.14). Entretanto, é possível encararmos a nós mesmos de forma estreita demais, mas somos muito mais do que genes e hormônios, emoções e aspirações, empregos e ideais; acima de tudo, há Deus. Grande parte, se não tudo, do que e quem somos tem a ver com Deus. Se tentarmos entender e formar a nós mesmos pelos nossos próprios meios, perderemos a maior parte do nosso ser. 
Assim, a comunidade cristã sempre insistiu em que as Escrituras Sagradas, que revelam os caminhos de Deus para nós, são necessárias e básicas para nossa formação como seres humanos. Ao lermos a Bíblia, chegamos à conclusão de que o que precisamos não é primariamente informação, algo que nos diga coisas acerca de Deus e de nós mesmos, mas de formação, que nos modele em nosso verdadeiro ser. 
A própria natureza da linguagem forma muito mais do que informa. Quando a linguagem é pessoal, que é a sua melhor forma, ela revela; e a revelação é sempre formativa — não sabemos mais, mas nos tornamos mais. Aqueles que melhor utilizam a linguagem, os poetas, os apaixonados, as crianças e os santos, usam as palavras para fazer — fazer declarações, fazer caráter, fazer coisas belas, fazer bondade, fazer verdade. 
...

No último livro que escreveu, C. S. Lewis falou sobre dois tipos de leitura: a leitura na qual usamos o livro para nossos próprios propósitos e a leitura na qual nós recebemos os propósitos do autor. A primeira garante somente uma má leitura; a segunda acena para a possibilidade de uma boa leitura:

Quando "recebemos", exercitamos nossos sentidos e imaginação, bem como várias outras faculdades de acordo com um padrão criado pelo autor. Quando "usamos", tratamos a leitura como uma assistente para as nossas próprias atividades... "Usar" é inferior a "recepção" porque a arte, quando usada em vez de recebida, meramente facilita, ilumina, alivia ou serve de paliativo para nossa vida, sem acrescentar nada a ela.(1)

Você percebe por que estou insistindo que uma conscientização do que a Igreja formulou acerca da Trindade Santa é tão importante quando nos aproximamos desse Livro, a Bíblia? Nós a lemos a fim de receber a revelação de Deus, que é extremamente pessoal; lemos a Bíblia da forma que ela chega a nós, e não da forma que nós chegamos a ela; nós nos submetemos às várias operações complementares do Deus Pai, do Deus Filho e do Deus Espírito Santo: recebemos essas palavras a fim de sermos formados agora e para a eternidade, para a glória de Deus. 

...

"Coma este livro" é a metáfora escolhida por nós para focar a atenção naquilo que envolve a leitura de nossas Sagradas Escrituras de maneira formativa; quer dizer, lê-las de tal forma, que o Espírito Santo as use para formar Cristo em nós. Não estamos interessados em saber mais, mas sim em sermos mais transformados. 
Estou colocando um crescente senso de urgência sobre esta questão porque já ficou claro que nós vivemos numa época na qual a autoridade das Escrituras em nossas vidas tem sido substituída pela autoridade do ser: somos encorajados de todos os lados a assumir o controle de nossas vidas e a usar nossa própria experiência como o texto autoritativo pelo qual vivermos. 
O elemento alarmante para mim é que esse espírito invadiu as igrejas evangélicas. Num grau maior ou menor, espero ver o mundo exterior tentando viver de forma independente. Mas não aqueles que confessam a Jesus como Senhor e Salvador. Eu não sou o único a advertir que estamos numa posição delicada e embaraçosa por sermos a Igreja que crê ardentemente na autoridade da Bíblia, mas, em vez de submeter-se a ela, apenas a usa, aplica e controla, usando a própria experiência como autoridade que determina como, onde e quando a usaremos. 
Meu propósito é conter essa soberania do ser reafirmando o que significa viver essas Escrituras a partir do interior, em vez de usá-las para nossos propósitos sinceros e devotos, mas mesmo assim gerados pela soberania do ser.


(1) C. S. Lewis, An Experiment in Criticism [Experimento em crítica] (Cambridge: Cambridge University Press, 1961) p. 88. Lewis também ofereceu esta ilustração: "Um [que recebe] é como alguém que é levado para um passeio de bicicleta por um homem que conhece estradas que ele jamais explorou. O outro (que usa) é como alguém que instala um pequeno motor em sua própria bicicleta e então anda por uma estrada que já conhece".

Extraído do livro Peterson, Eugene. Coma este Livro: a comunidade santa à mesa com as Sagradas Escrituras. Niterói, RJ: Textus, 2004. 


sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Senhor, hoje tentei correr o mundo...

Lucas 12:22-32 - Jesus está falando sobre depender da providência de Deus.

Senhor, hoje tentei correr o mundo por conta própria.
Tentei tão arduamente, Senhor, cuidar de todas as coisas.
  Tomei sobre mim todos os problemas,
todos os fardos, todas as preocupações de todos os que constituem o meu pequeno mundo.

Tentei tão arduamente, Senhor, e nada realizei.
Estou frustrada, confusa e esgotada
a ponto de derramar lágrimas.
Nada parecia ir bem.

Senhor, será que alguma vez aprenderei
que tu és aquele que a tudo controlas?
Que tu és aquele que conheces todas as respostas?
Que tu és o único que podes carregar os fardos intoleráveis que tentamos nós mesmos levar nos ombros?
Que és o único que podes resolver os problemas insolúveis?
Que és o único que realizas qualquer coisas de valor?
Que tudo depende de ti?

Senhor, às vezes me pergunto por que te incomodas de me suportares.
Às vezes me pergunto se não és terrivelmente tentado a me levar pelos ombros
e me sacudir até que meus dentes chocalhem.
Não te culparia se te sentisses assim.

Obrigada, Senhor, por me suportares hoje.

E obrigada, Senhor, por fazeres tudo a TUA maneira!



Oração de Garmon, Sue em Manning, Brennan. Convite à solitude. São Paulo: Mundo Cristão, 2010. p. 178 e 179.

domingo, 14 de outubro de 2018

Oração

Senhor, quero tanto fazer coisas grandes para ti.
Gostaria tanto de fazer um grande gesto, fazer algo realmente espetacular.
Algo GRANDE.
Mas não me pedes que eu faça coisas assim.

Pedes que eu faça as coisas pequenas e insignificantes que constituem a minha vida diária.
Não me pedes que eu faça algo grande e glorioso; apenas que eu faça o que devo fazer.
Não me pedes que faça algo realmente espetacular; apenas que eu ame o próximo.
Não me pedes que faça algo realmente estupendo; apenas a rotina, os afazeres, entra dia e sai dia, de uma mulher em atividade. 

Senhor, quando sinto que o que estou fazendo é insignificante e sem importância, ajuda-me a lembrar que tudo o que faço é significativo e importante a teus olhos, porque tu me amas e me pões aqui, e ninguém mais pode fazer o que estou fazendo exatamente como faço.
E, Senhor, acredito que seria melhor te agradecer por não pedires nada extraordinário de mim.
Quando penso seriamente a esse respeito, não sei na verdade se estaria à altura.

Obrigada, Senhor, por conheceres minhas habilidades e aptidões.

Oração de Garmon, Sue em Manning, Brennan. Convite à solitude. São Paulo: Mundo Cristão, 2010. p. 74 e 75.

sábado, 13 de outubro de 2018

Distrações

    

    A oração e o amor se aprendem na hora em que a oração se torna impossível e o coração vira pedra.

***

    Quem nunca teve distrações não sabe orar. Pois o segredo da oração é a fome de Deus e da visão dele. Fome que está em um plano mais profundo do que o nível da linguagem e dos afetos. E que é perseguido pela memória e a imaginação com uma multidão de imagens e de pensamentos inúteis e às vezes até maus, pode ser forçado a orar muito melhor, nas profundezas de seu coração aflito, do que alguém cuja mente está nadando em conceitos claros, propósitos brilhantes e atos fáceis de amor.
    Por isso é inútil se perturbar ao não conseguir se livrar das distrações. Em primeiro lugar, é preciso perceber que estas muitas vezes são inevitáveis à vida de oração. A necessidade de se ajoelhar e suportar submergir em uma forte onda de imagens loucas e absurdas é uma das provações comuns da vida contemplativa. Se você achar que é obrigado a se defender dessa invasão utilizando um livro e se agarrando a suas frases como alguém que, ao se afogar, agarra-se a destroços, pode fazer isso; mas se permitir que a sua oração degenere em um período de simples leitura espiritual, estará perdendo muitos frutos. Seria muito mais proveitoso resistir pacientemente às distrações e aprender algo sobre sua incapacidade e desamparo. E se o seu livro se tornar apenas um anestésico, longe de ajudar a meditação, a destruirá.

***

    [...] a vontade de orar é a essência da oração, e o desejo de encontrar a Deus, de vê-lo e amá-lo, é a única coisa que importa. Se tiver o desejo de conhecê-lo e amá-lo, já fez o que era esperado de você, e é muito melhor desejar a Deus sem ser capaz de pensar claramente nele do que ter pensamentos fabulosos sobre Ele sem desejar unir-se à sua vontade.
    Por mais distraído que você possa estar, ore com esforços pacíficos, talvez até inarticulados, para centrar o seu coração em Deus, presente em você, apesar de tudo o que possa estar passando pela sua mente. A presença dele não depende de que os seus pensamentos estejam nele. Ele está infalivelmente presente, se não estivesse, você nem poderia existir. A lembrança de sua presença infalível é a âncora mais segura para nossa mente e nosso coração na tempestade de distrações e tentações, por meio das quais temos de ser purificados.




Merton, Thomas. Novas sementes de contemplação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2017. p.204-207.



segunda-feira, 8 de outubro de 2018

Sementes de Contemplação

Cada momento e cada acontecimento na vida de cada homem na terra planta algo em sua alma. Pois, assim como o vento leva milhares de sementes aladas, assim também cada instante traz consigo germes de vitalidade espiritual que vão pousar imperceptivelmente no espírito e na vontade dos homens. A maioria dessas inumeráveis sementes perece e se perde porque os homens não estão preparados para recebê-las: sementes como essas só podem germinar na boa terra da liberdade, da espontaneidade, do amor.

Precisamos aprender a perceber que o amor de Deus nos procura em cada situação e visa ao nosso bem. Seu amor imperscrutável busca o nosso despertar. 

A mente presa a ideias convencionais e a vontade cativa de seu próprio desejo não podem aceitar as sementes de uma verdade que lhes é estranha e de um desejo sobrenatural. De fato, como posso receber as sementes da liberdade se estou enamorado da escravidão, e como abrigar em mim o desejo de Deus se estou cheio de outro desejo, que lhe é oposto? Deus não pode plantar sua liberdade em mim porque sou prisioneiro e nem sequer desejo ser livre. Amo meu cativeiro e eu mesmo me aprisiono no desejo das coisas que odeio, e endureci meu coração contra o verdadeiro amor. Preciso, pois, aprender a me desfazer das coisas familiares e ordinárias e a consentir no que é novo e estranho para mim. Tenho de aprender a "deixar-me" para poder me encontrar ao me render ao amor de Deus. 

Pois é o amor de Deus que me aquece ao sol e o amor de Deus que envia a chuva fresca. É o amor de Deus que me nutre do pão que como e Deus que também me alimenta com a fome  e o jejum. É o amor de Deus que manda os dias de inverno em que sinto frio e estou enfermo, e também o verão quente quando trabalho e minha roupa está encharcada de suor. Deus sopra sobre mim o vento leve do rio e a brisa do bosque. Seu amor estende a sombra das árvores sobre minha cabeça e envia o menino com um balde de água da fonte, à beira dos campos de trigo, enquanto os lavradores repousam e suas mulas estão sob as árvores.

É o amor de Deus que me fala nos pássaros e riachos; mas, por trás do clamor da cidade, Deus também me fala em seus julgamentos. E todas essas coisas são sementes que me são enviadas por sua vontade.

Se essas sementes se enraizassem em minha liberdade, e se sua vontade crescesse nela, eu me tornaria o amor que Ele é, e minha colheita seria sua glória e minha própria alegria.

Minha preocupação principal não deve ser encontrar prazer ou sucesso, saúde ou  vida, dinheiro ou repouso, nem mesmo coisas como a virtude e a sabedoria - menos ainda seus opostos: dor, fracasso, enfermidade, morte. Mas, em tudo que acontece, meu único desejo e minha única alegria devem ser saber: "Aqui está o que Deus quis para mim. Nisto encontro o seu amor e, aceitando isso, posso retribuir seu amor e, com este, dar-me a Ele. Pois ao dar-me a Ele, eu o encontrarei, e Ele é vida eterna".

Assentindo com alegria na vontade de Deus e cumprindo-a com satisfação, tenho seu amor em meu coração, pois minha vontade é agora o mesmo que seu Amor e estou a caminho de me tornar o que Ele é, e Ele é Amor. Aceitando dele todas as coisas, recebo sua alegria em meu coração, não porque as coisas sejam como são, mas porque Deus é quem Ele é, e seu amor quis a alegria para mim em todas elas.

Merton, Thomas. Novas sementes de contemplação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2017. p.28-31.

sábado, 6 de outubro de 2018

Tua Forte Mão

Se a minha alma teme o amanhã
E o coração não vê o Teu cuidado,
Se eu não consigo ouvir a Tua voz,
Ainda assim confiarei.
Confiarei!

Eu sei que o meu Redentor Vive,
Que se levantará sobre a terra.
A Tua bondade transbordará
Meus desertos com misericórdia!

Tua forte mão, guarda os meus dias.
Mesmo sem te ver eu pertenço a Ti!
O Teu perdão me cura, oh Deus!
Tua cruz me limpa!
Eu sei que não mereço, mas
Me amas com amor sem fim.
Sem fim!

Sei que me amas 
de um modo totalmente gracioso Jesus, 
tão grande amor!


Dell Cordeiro e Paulo César Baruk





Contemplação: Deus em nossa vida cotidiana



“A contemplação é a consciência e a compreensão, e mesmo, em certo sentido, a experiência daquilo em que cada cristão obscuramente crê: ‘Não sou mais eu quem vive; é Cristo que vive em mim’. 
É um despertar, uma iluminação, e a surpreendente compreensão intuitiva por meio da qual o amor adquire a certeza da intervenção criadora e dinâmica de Deus em nossa vida cotidiana". 

 

“A contemplação é mais do que a mera consideração de verdades abstratas sobre Deus; mais, até, do que a meditação afetiva das coisas em que cremos. É um despertar, uma iluminação, e a compreensão intuitiva e maravilhosa, com que o amor se certifica da intervenção criadora e dinâmica de Deus em nossa vida cotidiana. A contemplação, portanto, não ‘encontra’ simplesmente uma ideia clara sobre Deus, confinando-o dentro dos limites dessa ideia, retendo-o como um prisioneiro a quem se pode sempre voltar. Pelo contrário, a contemplação é que é por Ele arrebatada e transportada ao seu próprio domínio, ao seu mistério, à sua própria liberdade. É um conhecimento puro e virginal, pobre em conceitos, mais pobre ainda em raciocínios, mas capaz, por sua própria pobreza e pureza, de seguir a Palavra ‘aonde quer que vá’.”


Merton, Thomas. Novas Sementes de Contemplação.  Rio de Janeiro: Editora Fissus, 2001, p. 12-13.

Oração - John Baillie


Décimo Primeiro dia
Manhã 

Ó Deus onipotente, sob cujo olhar vigilante decorre a nossa vida mortal, concede que, em todas as ações e propósitos de hoje, eu me porte com verdadeira cortesia e honra.

Faze-me justo e verdadeiro em todo o proceder. Não permitas que pensamentos vis ou indignos me ocupem a mente, nem por um instante. Consente que meus motivos sejam claros a todos e minha palavra como uma carta de fiança.

Não permitas que me aproveite das fraquezas de alguém. Concede que eu seja generoso ao julgar os outros, seja desinteressado nas minhas opiniões, leal para com os amigos, magnânimo para com os adversários. Que enfrente a adversidade com coragem. Não permitas que eu peça ou espere demais para mim mesmo.

Todavia, ó Senhor Deus, que eu não me satisfaça com algum ideal humano alienado de Cristo. Antes concede que eu tenha “o mesmo sentimento que houve “ nele. Não me deixes descansar até que chegue “à medida da estatura da plenitude de Cristo”.

Deixa-me escutar a pergunta de Cristo: o que fazeis mais do que os outros? E assim as três virtudes cristãs – fé, esperança e amor venham a ser mais e mais cultivadas em mim, até que todo o meu andar e conversar honrem o evangelho de Cristo.

Senhor, tu que provaste teu amor aos homens na paixão e morte de Jesus Cristo nosso Senhor, concede que o poder de sua cruz esteja comigo hoje. Permite-me amar como Ele amou. Permite-me ser obediente até à morte.

Embora eu dependa da sua cruz, não me deixes recusar a minha própria cruz.

Senhor, tu fizeste que o homem viva em família! Suplico a tua benção também para todos os membros desta casa, todos os meus vizinhos e todos os meus concidadãos.

Que Cristo reine em cada coração e sua lei seja honrada em cada lar. Que todo o joelho se curve diante dele e toda a língua confesse que tu és Senhor. 

Amém.

quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Minha alma tem sede de ti

... o homem é, segundo o pensamento de santo Agostinho, como uma seta disparada para um universo (Deus) que, como centro de gravidade, exerce uma atração irresistível, e quanto mais se aproxima desse universo, maior velocidade adquire. Quanto mais se ama a Deus, mais se quer amá-lo. Quanto mais conversamos com ele, mais vontade temos de com ele conversar. A atração para ele está na proporção da proximidade com ele.
Sem percebê-lo, sob todas as nossas insatisfações, corre uma torrente que se dirige para o Um, o único Um capaz de concentrar as forças do homem e de acalmar suas quimeras.
Ó Deus, tu és o meu Deus, por ti madrugo, minha alma tem sede de ti, minha carne anseia por ti como terra ressequida, esgotada, sem água (Salmo 62).
...
Deus não muda. É definitivamente pleno, portanto, imutável. Está, pois, inalteravelmente presente em nós e não admite diferentes graus de presença. O que realmente muda são nossas relações com ele, conforme nosso grau de fé e amor. A oração torna mais firmes essas relações, produz uma penetração mais entranhável do Eu-Tu, através da experiência afetiva e do conhecimento fruitivo. E a semelhança e a união com ele chegam a ser cada dia mais profundas.
...
Na medida em que o contemplador avança nos mistérios de Deus, Deus deixa de ser ideia para converter-se em Transparência e começa a ser Liberdade, Humildade, Prazer, Amor e, progressivamente, se transforma em Força irresistível e modificadora, que tira todas as coisas de seus lugares: onde havia violência, põe suavidade; onde havia egoísmo, põe amor e muda por completo "a face" do ser humano. 



Extraído de Larrañaga, Inácio. Mostra-me o teu rosto: caminho para a intimidade com Deus. 29 ed. São Paulo: Paulinas, 2011, p. 19-30.

Se não falas...

Se não falas,
vou encher o meu coração do teu silêncio
e guardá-lo comigo. 
E vou esperar imóvel,
como a noite, sentinela estrelada,
cabeça pacientemente inclinada.
A manhã há de chegar com certeza
e a sombra há de desvanecer-se.

E a tua voz se há de derramar
por todo o céu
em arroios de ouro.
E as tuas palavras hão de voar
cantando
de cada um dos meus ninhos.
E as tuas melodias hão de rebentar em flores 
por entre as minhas profusas ramagens.

R. Tagore


Extraído de Larrañaga, Inácio. Mostra-me o teu rosto: caminho para a intimidade com Deus. 29 ed. São Paulo: Paulinas, 2011, p. 7.

Presença escondida

Não estás; não se vê teu rosto. 
Estás. Teus raios se projetam em mil direções.
És a Presença escondida.

Ó Presença sempre obscura e sempre clara!
Ó Mistério fascinante para o qual convergem todas  as aspirações!
Ó Vinho embriagador que satisfazes todos os desejos!
Ó Infinito insondável que aquietas todas as quimeras!

És o mais Além e o Mais Aquém de tudo.
Estás substancialmente presente em todo o meu ser.
Tu me comunicas a existência e a consistência.
Tu me penetras, me envolves e me amas.
Estás em torno de mim e dentro de mim.
Com tua Presença ativa alcanças até as mais remotas 
e profundas zonas de minha intimidade.
És a Alma de minha alma, a Vida de minha vida,
mais Eu que eu mesmo; a realidade total e totalizante dentro da qual estou submergido.
Com tua força vivificante penetras tudo quanto sou e tenho.

Toma-me todo inteiro! O Tudo de meu todo!
E faze de mim uma viva transparência de teu ser e de teu amor.

Ó Pai queridíssimo!



Larrañaga, Inácio. Mostra-me o teu rosto: caminho para a intimidade com Deus. 29 ed. São Paulo: Paulinas, 2011, p.5.

segunda-feira, 1 de outubro de 2018

Cercas sagradas

"... o prazer deles está na lei do Senhore nessa lei eles meditam dia e noite. Essas pessoas são como árvores que crescem na beira de um riachoelas dão frutas no tempo certo, e as suas folhas não murcham. Assim também tudo o que essas pessoas fazem dá certo" (1).






Mesmo as fortes e veneráveis árvores que existem há centenas de anos não conseguem sobreviver quando não há proteção - quando não há cercas sagradas em torno de suas raízes.

Temos raízes delicadas - mais frágeis do que podemos imaginar - e,  a menos que encontremos uma forma de proteger e nutrir essas raízes, nós também tombaremos. Talvez a queda ocorra por meio de um grande colapso físico, emocional ou moral, ou talvez aconteça pouco a pouco ao longo de meses e anos, enfraquecendo gradualmente nossa vida, desgastando a nossa personalidade, matando a essência de quem somos e de quem poderíamos ser. 

Barulho. Gente conversando. Multidões. Política. Rádio. Telefone. Televisão. O cachorro do vizinho. Contas. Preocupações. Responsabilidades. Prazos. Tarefas intermináveis. Solicitações dos filhos. Conflitos afetivos.
A movimentação humana nos esgota. Não nos podemos esquivar da maioria dessas coisas. E essa não seria realmente a melhor solução. O que precisamos fazer é proteger a parte mais importante, aquela parte que se localiza no mais profundo da nossa alma, e que nos liga ao nosso Criador.

As escolhas que você faz com relação à essência de sua vida têm implicações eternas, que vão além de sua vã existência na terra. Paulo disse a Timóteo: "O exercício físico é de pouco proveito; a piedade, porém, para tudo é proveitosa, porque tem promessa da vida presente e da futura" (2).
Jesus disse que, quando você reduz a vida à sua essência - quando você realmente pensa em termos de tempo e eternidade - nada disso é realmente importante. Na verdade ele diz que apenas uma coisa é essencial.
Escolhemos passar um tempo silencioso e reflexivo com o Senhor? Ou permitiremos que as pressões da vida nos levem ao esgotamento? Construiremos uma cerca sagrada em volta de nossa essência, ou permitiremos que o frenesi humano desgaste nossas raízes espirituais e nos derrube diretamente ao chão?
Salomão escreveu: "Acima de tudo, guarde o seu coração, pois dele depende toda a sua vida"  (3).  Ele também nos exortou a construir uma cerca sagrada em torno das fontes da nossa vida, a zelar pela proteção da primavera interior que nutre e estimula tudo aquilo que ainda faremos.
Como conseguir isso? Prometo uma coisa: se você desenvolver um programa de auto-alimentação a partir da Bíblia e, diariamente, durante uma hora, permitir ser instruído pelo Espírito Santo de Deus, sua vida sofrerá uma transformação positiva sem precedentes.

Essa proteção lhe dará acesso livre a um Deus todo-sábio e todo-poderoso, que caminhará pessoalmente ao seu lado, passo a passo. 

...existe um chamado para retornar à Palavra de Deus como nossa base.


(1)  Acréscimo do blog. Salmo 1:2-3 - Versão Nova Tradução da Linguagem de Hoje.  
(2) 1 Timóteo 4:8 
(3) Provérbios 4:23 - Versão Almeida Revista e Atualizada.



Extraído de Cordeiro, Wayne. Mentores segundo o coração de Deus: preserve sua alma, estabeleça seu legado e mantenha viva a Palavra de Deus dentro de você. São Paulo: Editora Vida, 2008, p. 9-25.